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Foto do escritorGuilherme Ferreira Kaim

MINHA OBRA ATRASOU, E AGORA?

Obra atrasada

Nos últimos anos, houve uma crescente demanda na procura por contratos de compra e venda de imóveis na planta. A compra de imóvel na planta que ainda está em construção possui muitas vantagens, como o preço acessível, melhores formas de pagamento e uma valorização significativa no imóvel posterior à obra.


Mas imagine que você tenha realizado a compra de um imóvel na planta com previsão para ficar pronto em novembro de 2023, mas a obra não fica pronta e o construtor não entrega as chaves. Todos os seus planos de realizar a mudança na data estipulada em contrato foram por água abaixo. O que você pode fazer nessa situação em que a construtora atrasa a entrega da obra e quais são seus direitos?



DIREITO DO CONSUMIDOR


O incorporador/construtor de uma obra, seja pessoa jurídica ou pessoa física, é caracterizado como fornecedor de um produto ou serviço, então o comprador adquirente de um imóvel na planta é consumidor e terá proteção aos seus direitos com base no Código de Defesa do Consumidor.


A proteção aos direitos do consumidor é importante no direito imobiliário para regulamentar e limitar as relações, principalmente as relações contratuais, para não haver abuso de direito e nem desequilíbrio contratual. 


Eu já fiz um post falando sobre a possibilidade de desistir da compra de um imóvel, se tiver interesse: Posso desistir da compra de um imóvel?



QUANDO CONSIDERAR QUE A OBRA ESTÁ ATRASADA?


Antes de tudo é importante que as partes não abusem da boa-fé contratual que existe entre elas e assim sendo necessário analisar se a obra está realmente atrasada.


O primeiro passo para verificar se a obra está em atraso é olhar as cláusulas do contrato entre o incorporador/construtor com o consumidor/adquirente. Neste contrato, deve constar o prazo em que a obra será entregue, bem como suas regulamentações quanto a cobrança de condomínios.


Caso a data que conste no contrato esteja realmente atrasada, é necessário avaliar, como um segundo passo, se há alguma cláusula no contrato que diz respeito ao prazo de tolerância. Esse prazo de tolerância, se previsto no contrato de forma clara e destacada, é de 180 (cento e oitenta) dias após a data prevista para entrega.


A própria Lei 13.786/2018 estabelece esse prazo de tolerância, caso a obra atrase e esteja previsto, pois é comum que durante o período de obra haja alguns imprevistos que impeçam o andamento normal da construção. Dessa forma, estando dentro desse prazo, não há o que se falar em resolução do contrato ou outras penalidades.


Art. 43-A. A entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador.

Depois de verificar se o prazo de conclusão estipulado do contrato está atrasado e se passou 180 (cento e oitenta) dias após esse prazo de entrega, o adquirente/consumidor terá seus direitos violados e poderá exigi-los de forma judicial ou extrajudicial, necessitando da assessoria de um advogado especialista em direito imobiliário para auxiliá-lo.


As opções para o adquirente são: Resolução do contrato com a devolução do valor pago; indenização por danos materiais; suspensão de juros da obra; e em certos casos, o dano moral, conforme veremos abaixo.



RESOLUÇÃO DO CONTRATO (DESFAZER O NEGÓCIO) E DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO


A primeira hipótese caso haja atraso na obra é a resolução do contrato, ou seja, extingue-se o contrato celebrado entre o adquirente e o incorporador/construtor e o adquirente ainda tem direito a devolução da integralidade do valor pago, multa contratual prevista na cláusula penal em até 60 dias corridos do dia da resolução do contrato e corrigidos monetariamente, conforme dispõe a Lei n. 4.591/64 e sua alteração pela Lei n. 13.786/18, respectivamente:


§ 1º Se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido no caput deste artigo, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do § 8º do art. 67-A desta Lei.


INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS


Entretanto, não havendo interesse em extinguir o contrato, o adquirente/consumidor tem outra opção e não prejudica seu contrato de compra do imóvel na planta. Estendendo-se o prazo do contrato por 180 (cento e oitenta) dias após a data de conclusão estipulada em contrato, não sendo caso de resolução do contrato, pode o adquirente exigir do incorporador/construtor o pagamento de uma indenização, correspondente a 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, corrigido monetariamente até a entrega da obra.


Importa ressaltar que estas disposições são válidas para os contratos que foram assinados após 2018, com a mudança da Lei de Distrato, em que o cálculo é a multiplicação de 1% X o total dos valores já pagos X quantidade de meses atrasados.


Já para os contratos assinados antes de dezembro de 2018, aplica-se o percentual de 0,5% X o valor total do contrato X quantidade de meses atrasados.


Além dessa modalidade de indenização, ainda é possível, a depender do caso concreto, da indenização do dano material em lucros cessantes e danos emergentes.



DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES


Após a data prevista para conclusão da obra e havendo o atraso na entrega do imóvel, o adquirente/consumidor poderá ter direito aos danos emergentes ou lucros cessantes, a depender do caso concreto. 


Mas o que é danos emergentes e lucros cessantes?


Dano emergente: É o prejuízo sofrido pelo adquirente. Ou seja, se após a data prevista para conclusão da obra e não houver a entrega das chaves do imóvel e em consequência disso o adquirente tiver algum prejuízo, poderá ser ressarcido a título de danos emergentes. Entretanto, para que haja indenização em danos emergentes, o adquirente deve provar o prejuízo e que ele ocorreu por conta do atraso da obra, além de verificar a proporcionalidade da indenização.


Lucros cessantes: Diz respeito ao valor que o adquirente deixou de lucrar e que se não fosse o atraso na obra não teria este prejuízo. Esta modalidade de dano é presumida, não sendo necessário provar. Um exemplo desse tipo de dano é quando o adquirente mora de aluguel e contava, de acordo com seu contrato de aluguel, que na data prevista em contrato para conclusão da obra não iria mais precisar gastar com pagamento de aluguel, uma vez que poderia se mudar para sua própria casa, mas que por conta do atraso da obra terá que continuar com o contrato de aluguel. Nesse caso, o incorporador/construtor deverá pagar a indenização a título de lucros cessantes para o adquirente.



CABE DANO MORAL?


A lei dispõe todas as regulamentações e formas de indenizações possíveis caso haja atraso na obra pelo incorporador/construtor. Assim, em regra não é cabível indenização por danos morais pelo simples atraso na entrega do imóvel.


De acordo com a jurisprudência, a indenização por danos morais poderá ocorrer apenas em casos excepcionais com a comprovação da grave ofensa aos direitos de personalidade do adquirente.


É possível verificar alguns casos de aplicação de dano moral para aquelas obras atrasadas no período maior que um ano após o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias. Entretanto, para a condenação em danos morais é necessário a análise por um advogado especialista em direito imobiliário para verificar a possibilidade de ressarcimento.



SUSPENSÃO DOS JUROS DE OBRA


Em algumas situações, a compra do imóvel quando financiada por alguma instituição bancária, cobra-se o famoso “juros de obra” pelo banco até a entrega do imóvel.


Contudo, se a obra está atrasada, o adquirente/consumidor não poderá ser penalizado e continuar pagando os juros de obra ao banco em decorrência de um descumprimento da obrigação do incorporador/construtora.


Dessa forma, a responsabilidade de pagar os juros de obra são do construtor/incorporador até a entrega das chaves do imóvel.



QUANDO É OBRIGATÓRIO COMEÇAR A PAGAR O CONDOMÍNIO?


Também é comum que a partir da data prevista para entrega do imóvel o adquirente/consumidor inicie sua obrigação de pagar o condomínio mensal. Entretanto, no caso da obra atrasada, o condomínio deverá ser arcado pela incorporadora/construtora, devendo o adquirente/consumidor iniciar os pagamentos de condomínio somente após a entrega das chaves do imóvel.



Assim, pela análise da lei e dos contratos, é possível verificar que o legislador e o judiciário tentaram equilibrar as relações entre incorporador/construtora e consumidor/adquirente, para que nenhuma das partes abuse do direito alheio e nem que as partes saiam no prejuízo sem ter dado causa a isso e de forma proporcional.


Dessa forma, é importante que se conheça as possibilidades do adquirente, caso a sua obra atrase, assim como que o incorporador saiba o prazo de tolerância e a sua responsabilidade civil em decorrência do atraso da obra.


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